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Tributação aperta juro sobre capital próprio

Entre as medidas tributárias do pacote fiscal do governo federal, a alteração no benefício dos juros sobre capital próprio (JCP) deve elevar em até 50,5% a carga tributária sobre essa forma de distribuição de lucros. A medida atinge empresas responsáveis por 90% do faturamento da indústria de transformação. O impacto para o setor deve ser de pelo menos R$ 474 milhões em 2016, o que corresponde a 43% dos R$ 1,1 bilhão que a União calcula que irá arrecadar com a mudança no ano.

Com a retomada da atividade econômica, porém, a arrecadação pode ser muito maior que a estimada pelo governo. A distribuição de R$ 29 bilhões em juros sobre capital próprio em 2012, por exemplo, teria rendido, com a medida proposta pelo governo, R$ 1,48 bilhão a mais de arrecadação adicional somente na indústria de transformação, mesmo sem nenhum ajuste inflacionário.

Os cálculos constam de estudo do departamento de competitividade da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), que avaliou o impacto das mudanças estabelecidas na Medida Provisória (MP) 694/2015 para a dedutibilidade do JCP.

José Ricardo Roriz Coelho, diretor de competitividade da Fiesp, diz que, caso seja aprovada a alteração, cada empresa deve reanalisar sua política de distribuição de lucros para verificar se o JCP mantém-­se interessante ou parte dos pagamentos pode passar a ser feito como os dividendos tradicionais. “De qualquer forma há um impacto que desestimula investimentos que no Brasil são tradicionalmente financiados por recursos próprios”, diz.

O estudo destaca que 70,4% dos investimentos da indústria de transformação em 2014 foram pagos com capital próprio. A mudança nos juros sobre capital próprio onera, diz ele, a principal fonte de recursos para investimentos. Isso, argumenta, num momento em que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) única fonte interna de financiamento de longo prazo, vem enxugando a oferta de crédito. “Não podemos também depender do mercado de capitais que não consegue financiar o setor produtivo e que está encolhendo, praticamente sem IPOs”, diz ele, referindo-­se às ofertas públicas para abertura de capital.

A medida, diz Roriz, deve agravar ainda mais a situação do investimento na indústria. Ele lembra que pesquisa feita no setor durante o primeiro semestre projetava redução de 32,7% na intenção de investimentos em 2015, na comparação com o ano passado.

Everardo Maciel, sócio da Logus Consultoria e secretário da Receita Federal em 1995, quando o mecanismo do JCP foi criado, diz que a restrição proposta ao mecanismo de distribuição de lucros fará com que, nas multinacionais, parte dos recursos das matrizes que ingressam atualmente no país como capital próprio passem a entrar como empréstimo. Isso porque o empréstimo gera pagamento de juros dedutíveis e a restrição estabelecida pela medida provisória, na prática, reduz a taxa de retorno sobre o capital próprio.

“O governo na verdade está na contramão ao querer limitar os juros sobre capital próprio”, diz Maciel. Ele destaca que há uma grande discussão sobre o tamanho excessivo do setor financeiro nas economias. E uma das medidas discutidas para reduzir riscos de explosão do crédito é o fim da dedutibilidade dos juros. Maciel diz, porém, que o JCP, que permite a dedutibilidade de valores pagos sobre recursos próprios, seria um instrumento de equilíbrio à dedução dos juros pagos a terceiros. “Há pouco tempo eu disse em seminário internacional que tínhamos no Brasil a solução para essa discussão sobre a dedutibilidade dos juros”, diz Maciel.

Os juros sobre capital próprio são, assinala, uma invenção do Brasil e pode ser uma solução para os países que não o tem. “Trata­se de uma jabuticaba. Uma jabuticaba de exportação.”

Atualmente o benefício fiscal do JCP se dá no cálculo do tributos sobre a renda ­ o Imposto de Renda (IR) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). A MP propõe algumas mudanças que tiram parte da vantagem do benefício. Hoje o pagamento dos juros sobre capital próprio obedece a alguns limites. Entre eles, a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) aplicada sobre o patrimônio líquido. A MP propõe limite fixo de 5%. Como a TJLP atualmente é de 7%, na prática a regra proposta na MP tiraria dois pontos percentuais desse limite que hoje as empresas podem usar.

Outra mudança da MP é na tributação ao acionista. Ou seja, no IR fonte retido no pagamento ao beneficiário da distribuição de JCP. A MP eleva esse IR na fonte dos atuais 15% para 18%. Apenas essa última mudança de tributação custaria à indústria de transformação os R$ 474 milhões em recolhimento de IR e CSLL para 2016, o que significaria elevar em 20% a carga tributária sobre o pagamento do JCP.

O cálculo levou em consideração os valores pagos em 2014, estimados com base nos dados de lucro antes do IR do IBGE e nos valores pagos em JCP fornecidos pelo Ibmec. As duas mudanças juntas ­ o teto fixo de 5% sobre patrimônio e o IR fonte ­ podem elevar o aumento de carga tributária sobre o JCP a 50,5%.

Por Marta Watanabe
Fonte: Valor Econômico

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