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A Lei Complementar nº 116/03 e o Aspecto Espacial da Regra Impositiva da Hipótese de Incidência do ISSQN

Como se sabe, a lei tributária tem vigência circunscrita ao território do Município detentor da competência constitucional para exigir o ISSQN, consoante impõe o princípio da territorialidade da tributação.

A priori, e aí reside a premissa a ser considerada pelo intérprete e aplicador da legislação fiscal, poder-se-ia dizer que o ISSQN é devido ao território do Município em que forem prestados os serviços, todavia, efetuando-se uma análise histórica das normas de regência desse tributo, verifica-se que norma geral de regência do imposto em tela (LC nº 116/03) não patrocina dita e genérica conclusão.

O Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172/66) não especifica qual o âmbito espacial da norma jurídica de incidência do ISSQN. Na época em que fora editado, concebia-se que o imposto era devido no local onde o serviço viesse a ser prestado, de acordo com o princípio locus regit actum.

O Ato Complementar nº 36/67 versava sobre a hipótese de empresas que realizassem prestação de serviços em mais de um município (art. 6º). Considerava-se local da operação, para fins de incidência do ISSQN: I – o local onde fosse efetuada a prestação de serviço: (a) no caso de construção civil; (b) quando o serviço fosse prestado, em caráter permanente, por estabelecimentos, sócios ou empregados da empresa, sediados ou residentes no município; II – o local da sede da empresa, nos demais casos.

O Decreto-lei nº 406, de 31.12.1968, por sua vez, mudou a orientação anteriormente mencionada, sendo que seu art. 12 passou a considerar local da prestação de serviço, em relação à construção civil, aquele onde se efetuar a obra (alínea b). Definiu também como local da prestação do serviço o do “estabelecimento prestador”, ou, na falta deste, o “do domicílio do prestador” (alínea a).

A superveniente Lei Complementar nº 116/03, atual norma geral em matéria de legislação tributária sobre o ISSQN (CRFB/88, art. 146, III, a), em seu art. 3º, adotou a mesma orientação geral do art. 12 do Decreto-lei nº 406/68, determinando que o “o serviço considera-se prestado e o imposto devido no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador”, estabelecendo o mesmo diploma legal, em caráter taxativo, 22 (vinte e duas) hipóteses de exceções à regra geral, em que o ISSQN será devido não no local do estabelecimento prestador, mas no local da efetiva prestação de serviços, a saber:

“Art. 3o O serviço considera-se prestado e o imposto devido no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, exceto nas hipóteses previstas nos incisos I a XXII, quando o imposto será devido no local:
I – do estabelecimento do tomador ou intermediário do serviço ou, na falta de estabelecimento, onde ele estiver domiciliado, na hipótese do § 1o do art. 1o desta Lei Complementar;
II – da instalação dos andaimes, palcos, coberturas e outras estruturas, no caso dos serviços descritos no subitem 3.05 da lista anexa;
III – da execução da obra, no caso dos serviços descritos no subitem 7.02 e 7.19 da lista anexa;
IV – da demolição, no caso dos serviços descritos no subitem 7.04 da lista anexa;
V – das edificações em geral, estradas, pontes, portos e congêneres, no caso dos serviços descritos no subitem 7.05 da lista anexa;
VI – da execução da varrição, coleta, remoção, incineração, tratamento, reciclagem, separação e destinação final de lixo, rejeitos e outros resíduos quaisquer, no caso dos serviços descritos no subitem 7.09 da lista anexa;
VII – da execução da limpeza, manutenção e conservação de vias e logradouros públicos, imóveis, chaminés, piscinas, parques, jardins e congêneres, no caso dos serviços descritos no subitem 7.10 da lista anexa;
VIII – da execução da decoração e jardinagem, do corte e poda de árvores, no caso dos serviços descritos no subitem 7.11 da lista anexa;
IX – do controle e tratamento do efluente de qualquer natureza e de agentes físicos, químicos e biológicos, no caso dos serviços descritos no subitem 7.12 da lista anexa;
X – (VETADO)
XI – (VETADO)
XII – do florestamento, reflorestamento, semeadura, adubação e congêneres, no caso dos serviços descritos no subitem 7.16 da lista anexa;
XIII – da execução dos serviços de escoramento, contenção de encostas e congêneres, no caso dos serviços descritos no subitem 7.17 da lista anexa;
XIV – da limpeza e dragagem, no caso dos serviços descritos no subitem 7.18 da lista anexa;
XV – onde o bem estiver guardado ou estacionado, no caso dos serviços descritos no subitem 11.01 da lista anexa;
XVI – dos bens ou do domicílio das pessoas vigiados, segurados ou monitorados, no caso dos serviços descritos no subitem 11.02 da lista anexa;
XVII – do armazenamento, depósito, carga, descarga, arrumação e guarda do bem, no caso dos serviços descritos no subitem 11.04 da lista anexa;
XVIII – da execução dos serviços de diversão, lazer, entretenimento e congêneres, no caso dos serviços descritos nos subitens do item 12, exceto o 12.13, da lista anexa;
XIX – do Município onde está sendo executado o transporte, no caso dos serviços descritos pelo subitem 16.01 da lista anexa;
XX – do estabelecimento do tomador da mão-de-obra ou, na falta de estabelecimento, onde ele estiver domiciliado, no caso dos serviços descritos pelo subitem 17.05 da lista anexa;
XXI – da feira, exposição, congresso ou congênere a que se referir o planejamento, organização e administração, no caso dos serviços descritos pelo subitem 17.10 da lista anexa;
XXII – do porto, aeroporto, ferroporto, terminal rodoviário, ferroviário ou metroviário, no caso dos serviços descritos pelo item 20 da lista anexa.

É de se asseverar que a Lei Complementar nº 116/03 assume duplo e proeminente papel sistemático à luz do art. 146, III, da Constituição de 1988: (i) tem o status de norma geral de direito tributário sobre o ISSQN; e, (ii) exerce o seu art. 3º a nobre missão de definir a regra delimitadora da solução de eventual conflito de competência, relativamente ao local em que deve ser considerado prestado o serviço, para fins de incidência do ISSQN.

Dita LC nº 116/03, em seu art. 3º, diferentemente do que possa transparecer em um primeiro súbito de vista, não prestigiou a orientação de que o ISSQN, como regra geral, é devido no local da prestação de serviços, ou seja, o princípio da lex loci actus (onde se efetua o serviço). Ao revés, aludidos comandos legais claramente sinalizam pela prevalência do princípio da lex domicili, ou seja, da incidência da lei do domicílio do estabelecimento prestador.

Calha ressaltar que a LC nº 116/03 não dispõe que o âmbito espacial da hipótese de incidência do ISSQN é o do estabelecimento “do prestador”, mas o do “estabelecimento prestador”. Logo, em um caso concreto, o que interessará analisar, para se verificar a existência ou não de vício congênito de eventual lançamento tributário realizado por uma autoridade fazendária, qual o estabelecimento que, em eventual período fiscalizado, prestou serviços com efetividade, gerando, conseguintemente, à percepção de valores contratados e que servirão de base imponível do ISSQN à respectiva autuação.

Nunca é demais ressaltar, como iterativamente prestigiado pela doutrina e chancelado pela legislação esparsa (v.g, Código Tributário Municipal de Itajaí, art. 5º), considera-se estabelecimento prestador: (a) local onde o contribuinte desenvolva a atividade de prestar serviços, de modo permanente ou temporário, e que configure unidade econômica ou profissional, sendo irrelevantes para caracterizá-los as denominações de sede, filial, agência, posto de atendimento, sucursal, escritório de representação ou contato ou quaisquer outras que venham a ser utilizadas; (b) local, edificação ou não, próprio ou de terceiros, onde sejam executadas atividades sujeitas à incidência do imposto, mediante a utilização de empregados, ainda que sob a forma de cessão de mão-de-obra, com ou sem o concurso de máquinas, equipamentos, ferramentas ou quaisquer outros utensílios.

Sobrepensados esses aspectos, a guisa de fecho, como já assentado pela Primeira Seção do STJ sob o rito do art. 543-C do CPC (REsp. nº 1.117.121/SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, DJe de 29.10.2009), a partir da LC nº 116/03, aplicar-se-á, à solução de eventuais controvérsias abarcando o aspecto espacial da norma jurídica de incidência do ISSQN, as seguintes diretrizes:

Primus, como regra geral, o imposto é devido no local do estabelecimento prestador, compreendendo-se como tal o local onde a empresa que é o contribuinte desenvolve a atividade de prestar serviços, de modo permanente ou temporário, sendo irrelevante para caracterizá-lo as denominações de sede, filial, agência, posto de atendimento, sucursal, escritório de representação, contato ou quaisquer outras que venham a ser utilizadas;

Secundus, na falta de estabelecimento prestador, no local do domicílio do prestador, isto é, o imposto somente será devido no domicílio do prestador se, no local onde o serviço for prestado, não houver “estabelecimento do prestador” (sede, filial, agência, posto de atendimento, sucursal, escritório de representação, contato ou quaisquer outras que venham a ser utilizadas);

Tertius, nas hipóteses previstas nos incisos I a XXII do art. 3º da LC nº 116/03, mesmo que não haja local do “estabelecimento prestador” ou local do “domicílio do prestador”, o imposto será devido nos locais indicados nas regras de exceção.

Fonte: Tributario.net
 

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